Você treina por 5 meses para o grande dia. Fez 23 longões, desgastou a pista
de atletismo da sua localidade, gastou uma boa grana com massagem e novos tênis
de corrida. Você está na melhor forma possível. É dada a largada e sente-se ótimo. Está a caminho de bater seu recorde pessoal na altura do
quilômetro 30 da maratona. Então, alguma coisa começa a dar errado. Você
sente-se progressivamente mais lerdo. Pela altura do quilômetro 35, diminuiu o ritmo para um trote lento e fica achando que deve treinar mais forte
para a próxima vez...
Não!
O mais provável é que o que lhe fez diminuir o ritmo nos últimos quilômetros
da maratona (ou qualquer outro evento que dure mais de uma hora e meia) foi a
desidratação ou o depleção de glicogênio. Alguns quilômetros extra de
treinamento não ajudarão muito, porém um plano bem elaborado para
hidratação e carboidratos para antes e durante a corrida podem fazer uma grande
diferença na performance.
Parece ótimo. Então, qual é o plano?
Antes da competição você deve se concentrar em: 1) carregar seu corpo com
carboidratos para elevar os estoques de glicogênio nos músculos no começo da
corrida; e 2) beber água suficiente para assegurar-se de estar bem hidratado.
Durante a corrida você precisa: 1) ingerir carboidratos para prevenir a
depleção de glicogênio; e 2) tomar líquidos para prevenir a desidratação.
Vamos começar com os carboidratos.
Sua
reserva de glicogênio
Há
apenas dois combustíveis para exercício físico de longa duração:
carboidrato e gordura. Os carboidratos são armazenados no corpo como glicogênio.
Gordura também é armazenada, como você bem sabe. Quando você corre, seu
corpo queima uma mistura de carboidrato e gordura. Quanto mais forte correr,
mais carboidratos usará, quanto mais devagar, mais gordura será utilizada na
mistura.
À
medida que suas reservas de glicogênio ficam progressivamente menores
durante a corrida, seu corpo tenta conservar o que ainda resta queimando mais
gordura. Já que gordura é 15% menos eficiente que carboidrato como fonte de
energia, quando você tem que usá-la acaba diminuindo o ritmo.
Se você comer uma dieta normal com em torno de 60% das calorias
vindas de carboidratos, provavelmente armazenará por volta de 1600 a 2000 calorias
de glicogênio nos músculos. Porém, se fizer "carregamento de
glicogênio", seus músculos serão capazes de armazenar em torno de 2500 a
2700 calorias de glicogênio. Cada quilômetro que corre queima mais ou menos de
55 a 75 calorias, dependendo do seu peso e metabolismo. Se você fizer um ótimo
trabalho de carregamento de carboidratos, terá somente o suficiente de glicogênio
para a maratona.
O que acontece se você não fizer o carregamento de carboidratos? Digamos que
você deseje correr uma meia-maratona em 1h40m. Nos últimos três dias antes da
corrida você diminui um pouco o treinamento e continua se alimentando
normalmente. Suas reservas de glicogênio estarão somente parcialmente cheias.
Você pode começar a ficar com pouca reserva de glicogênio a qualquer momento
depois de 1 hora de corrida, e cruzar a linha de chegada trotando tentando
imaginar o que aconteceu de errado.
O
carregamento de glicogênio também é importante antes de treinos que durem
mais de 1h30m. A última coisa que você quer, tanto fisicamente quanto
emocionalmente, é se arrastar para casa nas corridas longas. Se você der
prioridade aos carboidratos por 1-2 dias antes dos longões (e ficar hidratado)
aumentará suas chances de bom treinamento e experiência emocionalmente
positiva.
O
carregamento de carboidratos antes de um evento é precaução suficiente contra
o esvaziamento de carboidratos em corridas com até 2 horas de duração, porém
na maratona ainda há o risco. Uma vez que você pode armazenar somente em torno
de 2500 a 2700 calorias de glicogênio, não terá muita sobra para correr 42
km. Digamos que, por alguma razão, você faz apenas um trabalho razoável de
carregamento e armazena 2200 calorias de glicogênio. Ou digamos que você fez
um ótimo carregamento de carboidratos, mas devido ao seu metabolismo queime 75
calorias por quilômetro. Nestes casos você poderá ficar com as reservas de
glicogênio severamente baixas durante a maratona apesar do carregamento. A
solução é ingerir calorias extra durante a corrida.
Carregamento
de glicogênio
O carregamento de glicogênio (ou carregamento de carboidratos) tem sido popular
desde o final dos anos 60, quando Dr. Per-Olof Astrand mostrou que atletas podem
dobrar suas reservas de glicogênio nos músculos ao fazer uma corrida longa 7
dias antes da competição, então passar por uma dieta com pouco carboidrato
por 3 dias, seguida por dieta rica em carboidratos (70-80% de calorias de
carboidratos) pelos 3 dias precedentes à prova. A corrida longa esvazia sua
reserva de glicogênio e os 3 dias de dieta com pouco carboidrato a mantém
baixa. Isso engatilha um mecanismo no organismo para estocar o máximo de
carboidratos possível. O lado ruim dessa estratégia é que no terceiro dia da
dieta de pouco carboidrato você provavelmente estará fraco e irritável, e as
pessoas com que convive o evitarão como uma praga.
Felizmente, pesquisas mais recentes do fisiologista do exercício William Sherman
e outros, têm mostrado que as reservas de glicogênio podem ser elevadas na
mesma taxa sem as fases da corrida longa e dieta de pouco carboidrato. Aqui
está como. Coma uma dieta normal até 3 dias antes da competição e diminua
seu treinamento para em trono de metade do seu volume usual. Então, tenha uma
dieta rica em carboidratos pelos últimos 3 dias fazendo apenas trotes nesses
dias. Seu corpo armazenará glicogênio em um nível similar ao da estratégia
do Dr. Astrand
Você deve esperar ganhar algum peso no carregamento de glicogênio porque seu
corpo armazena 2,6 gramas de água para cada grama de glicogênio. Não fique
alarmado por causa do peso adicional. Ele é inevitável e a água armazenada na verdade ajudará a prevenir desidratação durante a corrida.
Ingerindo carboidratos durante a corrida
Se
você consumir carboidratos durante a corrida, suprirá combustível adicional
aos seus músculos e retardará ou prevenirá o esvaziamento de glicogênio. A
maneira mais fácil de consumir carboidratos durante a corrida é através de
bebidas esportivas, e ainda terá o benefício extra de ingerir fluidos ao mesmo
tempo. Pesquisas têm mostrado que bebidas com alta concentração de açúcar
podem levar mais tempo para saírem do estômago. Como cada corredor é um ser
único, você deve fazer experiências durante os treinamentos para descobrir
qual bebida e o quanto é melhor para você.
A
dica é encontrar o equilíbrio correto entre uma bebida com carboidratos que
seja forte o suficiente para fornecer as calorias necessárias, mas não a ponto
de ser absorvida lentamente do estômago. Para a maioria das pessoas, bebidas de
4-8% são as mais indicadas. Beber 800 gramas de uma solução de 4% por hora
supre 32 gramas de carboidratos, enquanto uma solução de 8% dá 64 gramas de
carboidratos por hora.
Cada grama de carboidrato contém 4,1 calorias, então você estará ingerindo
130-260 calorias por hora. Desta forma, se correr a maratona em 3 horas, você
tomará aproximadamente de 400-800 calorias durante a corrida. Com 60 calorias por
quilômetro há combustível de carboidrato suficiente para 6-12 km extra!
Ron Johnston, maratonistas e fisiologista do exercício, sabe por experiência
própria a necessidade de ingerir carboidratos durante a corrida. Ron
estava indo muito bem na corrida de 50 milhas Maine Track em 1997. Ron lembra-se
do dia: "estava ótimo na milha 34, sentindo-me o melhor possível e
correndo entre 4:10-4:20 min/km. Subitamente senti-me desorientado e sem
perceber havia diminuindo o ritmo para 5:10 min/km."
Johnston continua, "meu ritmo alterou-se
em poucos minutos, e estava claro que o culpado foi o esvaziamento das reservas
de glicogênio. O problema é que não há nenhum sinal de alerta até que seja
tarde demais. Quando você tem que diminuir o ritmo rapidamente a causa é
provavelmente o esvaziamento de glicogênio e não a desidratação. Fui para
casa e calculei que estava ingerindo somente 50-100 calorias a cada volta de 4
milhas. Isso nunca acontecerá de novo."
Ok, o macarrão está no prato, agora vamos falar sobre a desidratação.
A desidratação
O que há de tão ruim na desidratação? Não podemos somente superá-la com
força de vontade?
Vários
eventos sinistros ocorrem dentro do seu corpo que limitam a performance quando
você corre em um dia quente. Umidade alta faz as coisas ficarem piores ainda.
Primeiro, em esforço para resfriar, seu corpo automaticamente envia mais sangue
para a pele para que ele esfrie através da evaporação. Isso deixa menos
sangue para seus músculos das pernas. O resultado é que seus músculos obtêm
menos oxigênio e diminuem o ritmo. (É claro que se o seu corpo não mandasse
mais sangue para a pele para resfriamento você poderia superaquecer ou até
morrer, mas não teria que diminuir o ritmo!)
Segundo, em dias quentes você transpira mais e fica mais desidratado. Isso não
o surpreende, não é mesmo? Fisiologicamente, o que acontece quando você fica
desidratado é que seu volume sanguíneo diminui. Isso significa que seu corpo
tem que decidir o que fazer com o sangue restante. Então, seu corpo diz:
"vamos ver, é melhor enviar sangue para o cérebro, não quero que esse
corredor maluco morra. É melhor enviar sangue também para o coração e ainda algum
para a pele para livrar-se de todo esse calor corporal provocado pela
corrida. Hummm, não sobrou muito para os músculos das pernas." É por
isso que seu ritmo de corrida diminui.
Se você acha que o campeão na maratona olímpica de Atenas baterá o recorde
mundial, pense de novo. De fato, estudos têm mostrado que você diminui o ritmo
em torno de 2% para cada 1% de perda de peso corporal devido à desidratação.
Então, um corredor de 75 kg deverá diminuir o ritmo em 4% depois de perder 1,5
kg.
Não é incomum perder de 1,3 a 1,8 kg de água por hora correndo em um dia
quente. Depois de 2 horas de corrida nosso atleta de 75 kg poderá ter perdido 3
kg, o que representa 4% do peso corporal e 8% de perda na performance. A 5:00
min/km, diminuir 8% representa 48 segundos por quilômetro. Porém, se você
perder mais de 4-5% de seu peso corporal poderá não somente diminuir o ritmo,
mas ter que ser atendido na tenda de primeiros socorros.
Como prevenir a desidratação?
Para
prevenir a desidratação você precisa beber mais por 1-2 dias antes da corrida.
O mecanismo de sede do organismo não é perfeito, então se você bebe somente
quando tem sede provavelmente não ficará plenamente hidratado. Leva tempo até
que os tecidos do corpo absorvam água ou outros fluidos. Consumir bebidas com a
quantidade adequada de sódio acelerará a absorção. É melhor você beber um
pouco freqüentemente do que beber muito de uma só vez.
O que você deve beber? Água não é muito atraente, porém com um pouco de
sódio adicionado faz o trabalho corretamente. Você deve evitar bebidas com
cafeína, como café, chá e refrigerante tipo cola, já que ela é diurética.
De forma similar, o ritual da cerveja na noite antes da corrida pode acalmar
seus nervos, mais é contraproducente para a hidratação. Se você tiver que
tomar uma cerveja, beba um copo extra de água para equilibrar o efeito
desidratante do álcool.
Você
pode beber até o começo da corrida. Com o excitamento nervoso do dia da
corrida você provavelmente urinará mais do que o comum, mas reterá algum
fluido e dever certificar-se de estar plenamente hidratado para começar a prova.
O quanto você deve beber durante a corrida?
Isso
depende parcialmente do calor e umidade no dia da corrida. A quantidade máxima
que deve beber é aquela que pode ser esvaziada de seu estômago.
Pesquisas
têm descoberto que a maioria dos corredores tem estômago que pode esvaziar
somente em torno de 170 a 220 gramas de fluidos a cada 15 minutos durante a
corrida. Se você beber mais que isso, o fluido extra irá somente ficará pulando
no seu estômago e não dará qualquer benefício extra. Porém, seu estômago
pode ser capaz de lidar com menos ou mais que a média, então mais uma vez
experimente durante o treinamento.
Você
pode ingerir fluidos suficientes para prevenir a desidratação em um dia
quente?
Vamos examinar o transpiração versus ingestão. Em um dia quente você pode
perder 1,8-2,3 kg de água por hora. Já estimamos que seu estômago pode absorver
em torno de 800 gramas por hora. Isso dá um déficit de 1-1,5 kg por hora.
Você não consegue beber quantidade suficiente e, infelizmente, quanto mais
tempo ficar correndo maior será o déficit de fluidos.
A melhor estratégia em dias quentes é encarar os fatos fisiológicos. Diminua
seu ritmo desde o começo ao invés de esperar até que as forças do seu corpo
o obriguem a fazê-lo. Beba no primeiro posto de hidratação mesmo que não
esteja com sede. Tente beber um copo completo a cada posto de hidratação.
Leslie Behan, uma maratonista de 3:28, aprendeu sobre desidratação da pior
maneira quando ela correu uma série de maratonas em clima quente alguns anos
atrás. A primeira, Boston, foi quente e ela quebrou, então na Maratona Cape Cod
também estava calor e ela quebrou novamente. Quando foi correr a Sugarloaf Marathon,
mais uma vez em clima quente, ela mudou a estratégia: "decidi andar
nos postos de hidratação e beber o máximo que podia. Nos últimos
quilômetros me senti ótima e ultrapassando outras pessoas. Agora sei o quanto
meu organismo precisa de água.".
Agora que você sabe a teoria, é hora de partir para a prática. Experimente
algumas bebidas esportivas durante o treinamento para descobrir qual funciona
melhor para você. Desenvolva seu próprio plano para ingerir água e
carboidratos.
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Créditos:
Tradução copyright © por Helio Augusto Ferreira Fontes
Texto copyright © por
Pete Pfitzinger
Pete Pfitzinger é fisiologista do exercício com mais de 20 anos de
experiência em treinamento de atletas. Pete acredita no princípio
de que cada corredor é único e que os programas de treinamento
devem ser moldados de acordo com os pontos fortes e fracos de cada
atleta individualmente.
Pete Pfitzinger
é co-autor dos livros de sucesso:
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